Além da Superfície

Por que o Brasil ainda precisa do petróleo em tempos de transição energética?

*Por Caio Mello, do Meio.

O Brasil está à frente da média global na transição energética. Metade da oferta total de energia já vem de fontes renováveis e a matriz elétrica é majoritariamente renovável graças a usinas hidrelétricas, energia eólica e solar. Além disso, o país é o segundo maior produtor de biocombustíveis, e a produção de petróleo no pré-sal tem intensidade de carbono abaixo da média mundial.

Ainda assim, depender apenas de fontes renováveis de energia não é adequado atualmente, seja pelo aspecto técnico, econômico ou social. Por isso, a transição energética é um processo gradual, que também pode ser chamado de “evolução energética” para indicar que diferentes fontes e tecnologias coexistirão juntas por um tempo.

Por exemplo, para se garantir a segurança energética, é necessário não depender exclusivamente do vento e do sol. Exercendo o papel de garantidor de segurança energética, o gás natural dá lastro ao crescimento de eólicas e solares e ajuda a descarbonizar atividades difíceis de eletrificar como siderurgia, cimento e mineração.

Mesmo com metas climáticas mais ambiciosas, as projeções indicam que o petróleo não desaparecerá por um bom tempo. A Agência Internacional de Energia estima que em um cenário de aquecimento limitado a 1,5 grau ainda haveria produção de cerca de 24 milhões de barris por dia em 2050, com a maioria destinada a usos não energéticos como na petroquímica, plásticos e fertilizantes. A mesma agência projeta demanda relevante por gás para produzir hidrogênio e amônia em escala.

Uma transição energética eficiente só pode acontecer com muita tecnologia envolvida. E desde 1998 a indústria brasileira de óleo e gás investiu mais de 30 bilhões de reais em pesquisa, desenvolvimento e inovação. Nos últimos anos, os projetos voltados à eficiência e baixo carbono se multiplicaram e atraíram recursos para biocombustíveis, eólica, hidrogênio verde, captura e armazenamento de carbono, sistemas híbridos e solar. É esse esforço que torna viáveis as soluções que ainda não ganharam escala.

Há também a dimensão social de uma transição justa. O setor de óleo e gás representa parcela relevante do PIB industrial e sustenta milhões de empregos diretos e indiretos. A atividade gera receitas para União, estados e municípios que financiam políticas públicas em educação, saúde e assistência. Mudar rápido demais sem planejamento pode pressionar regiões produtoras inteiras e trabalhadores, o que ampliaria a desigualdade.

Sem contar que o desenho da matriz energética precisa considerar a realidade de cada região. O Nordeste tem sol e vento abundantes, o Sul e o Sudeste dependem mais de fontes hídricas, enquanto a Amazônia e a Região Norte impõem limites ambientais claros para não buscar fontes energéticas que contribuam com o desmatamento. Armazenamento, redes de transmissão, modernização da operação do sistema e programas de eficiência são então necessárias para ampliar a energia de baixo carbono de forma acessível e confiável.

Se a energia renovável é o futuro, o Brasil tem enormes vantagens competitivas para liderar essa agenda. O caminho seguro combina a expansão acelerada das fontes sustentáveis com uso responsável do gás e dos derivados de petróleo em aplicações essenciais, enquanto a inovação abre espaço para novas tecnologias. Dessa forma,  o país combateria a falta de acesso à energia, manteria a tarifa em custos moderados à população, reduziria a poluição e manteria empregos e a economia circulante.