Biocombustíveis ganham força, mas concorrer com combustíveis fósseis é desafio

Cenário Brasileiro
Publicado em 10 de outubro de 2025 | Atualizado em 13 de outubro de 2025

*Por Caio Mello, do Canal Meio.

O debate entre eletrificação e biocombustíveis não é sobre fazer uma opção, já que, no Brasil, os dois caminhos avançam lado a lado. De um lado, a eletrificação cresce apoiada em uma matriz elétrica que já é majoritariamente renovável. De outro, os biocombustíveis seguem como uma das forças mais consolidadas da transição energética, aproveitando vantagens comparativas do Brasil, sobretudo o sol, solo fértil e a biomassa.

Vale ressaltar que os biocombustíveis podem ser de três tipos, conforme suas matérias-primas utilizadas. Os de primeira geração, como o etanol da cana e o biodiesel de soja, dominam o mercado e são a base da política energética brasileira há décadas. Também têm a caraterística “food and feed”, ou seja, são caracterizados por insumos que também servem à alimentação humana e animal. Nesse contexto, a Europa adota critérios bastante rigorosos — em alguns casos, considerados excessivos — que dificultam também as relações comerciais.  Importante ressaltar que o etanol e a soja produzidos no Brasil não estão associados ao desmatamento ou à retirada de alimentos da cadeia de consumo.

A segunda geração, que ganhou impulso nos últimos anos, busca justamente afastar esse tipo de crítica. Ela usa resíduos agrícolas e industriais, bagaço de cana, sebo animal e óleo de cozinha usado para produzir os biocombustíveis. É o caso do etanol 2G, já em operação em algumas usinas, que aumenta a produção sem expandir área plantada e reduz ainda mais as emissões de gases poluentes.

Mais distante da escala comercial, a terceira geração aposta mais em matérias-primas como algas e microrganismos modificados. O Brasil tem potencial nesse segmento, mas ainda pouco desenvolvimento.  O país tem uma costa gigantesca, que pode servir de laboratório e desenvolvimento para a cultura de algas.

Há também novas rotas, como o processo Fischer-Tropsch, que transforma resíduos florestais e agrícolas em combustíveis líquidos. A tecnologia ainda avança, mas pode ser fundamental ao permitir diesel e gasolina sintéticos a partir de biomassa abundante. Isso porque, competir com combustível líquido fóssil não é fácil, especialmente por conta da densidade energética, sendo necessário ser bastante criativo para superar essas diferenças naturais.

Pode-se citar o exemplo de um navio, que é possível ir do ponto A ao B com um tanque de X metros cúbicos. Se quisermos trocar o bunker, que é um combustível fóssil, por alternativas como o e-metanol ou GNL, será necessário mais espaço de tancagem a bordo, para garantir a mesma quantidade de energia, porque eles têm menos densidade energética.

O avanço das diferentes gerações mostra que a transição é menos sobre uma ruptura e mais sobre evolução. O Brasil, que é o segundo maior produtor de biocombustíveis do mundo, mantém o que já funciona, para garantir segurança energética para suprir a atual demanda, enquanto experimenta novas soluções.

Nesse sentido, as duas rotas, de eletrificação e biocombustíveis, apontam para sentidos complementares. Enquanto a eletrificação avança sobretudo em veículos urbanos, indústria leve e geração distribuída, os biocombustíveis seguem essenciais nos setores em que a eletricidade ainda custa caro ou é inviável, como o transporte pesado e a aviação. E a tendência é que essa complementaridade faça do Brasil um caso raro de um país que possa reduzir emissões sem abrir mão de sua matriz produtiva e até a utilizando como um pilar da economia.