*Por Caio Mello, do Canal Meio.
Com 5 mortes confirmadas e 9 óbitos em investigação no Brasil, a crise do metanol em bebidas alcoólicas destiladas fez a substância entrar nos assuntos mais comentados. O mau uso e a desinformação, porém, fazem com que os usos benéficos desse combustível sejam esquecidos.
O metanol é um insumo presente em tintas, solventes, plásticos, produtos farmacêuticos, adesivos e combustíveis, e que por isso sustenta parte essencial da indústria química e da transição energética. Ele é indispensável na produção de biodiesel no Brasil, pois cada metro cúbico exige em torno de 115 litros da substância. Também pode ser usado, enquanto metanol verde (e-metanol), como meio de transporte (“carrier”) para o hidrogênio verde, e combustível alternativo em setores como o transporte marítimo, que busca reduzir suas emissões. Mesmo com todos esses usos, o Brasil, ao longo dos anos, deixou de ser produtor e hoje importa 100% do metanol que consome.
Isso aconteceu por razões econômicas. A fabricação convencional depende fundamentalmente do gás natural, matéria-prima com preço bem mais elevado que os principais produtores externos. Enquanto nos Estados Unidos o gás natural custa em torno de US$ 2 por milhão de British Thermal Unit (BTU), aqui o preço médio oscila em torno dos US$ 12, o que inviabilizou plantas nacionais e levou ao fechamento das fábricas que existiam até 2016. Hoje, os principais fornecedores globais são regiões com gás barato, como Arábia Saudita, Irã, China e Trinidad e Tobago
Mesmo assim, o Brasil tem potencial para voltar a ser produtor de metanol verde. Há três rotas principais. O biometanol, feito a partir de biomassa; o e-metanol, produzido com hidrogênio verde e CO2 capturado; e o metanol azul, que usa fontes fósseis com captura de carbono. O país tem vantagens nas três frentes por ser líder em energias renováveis, ter biomassa em abundância e capacidade técnica para desenvolver as tecnologias.
Mas novamente o aspecto do custo se impõe. A diferença entre o e-metanol e o metanol convencional pode chegar a 4 a 5 vezes mais, reflexo dos custos de produção e a escala reduzida. Mas há setores dispostos a pagar mais por produtos mais descarbonizados. O transporte naval é um deles, isso porque as regras internacionais têm imposto limites de emissão cada vez mais rigorosos, e muitas empresas preferem pagar mais por combustíveis que emitem menos do que por multas elevadas.
Outros usos também ganham espaço. A capacidade do metanol de transportar o hidrogênio verde de forma segura e em alta escala pode torná-lo estratégico para a logística da transição energética. Um litro de metanol contém mais hidrogênio do que um litro de H2 liquefeito. A substância também é compatível com a infraestrutura atual de transporte e armazenamento, o que facilita sua adoção.
O metanol, quando utilizado e manipulado com os devidos cuidados, é seguro e produtivo. O risco está no desvio para mercados ilegais, como ocorreu na crise recente das bebidas. O metanol não tem cheiro nem sabor marcantes, e seu custo é baixo. Isso o torna atrativo para fraudes, especialmente nos combustíveis e em bebidas falsificadas. Mas ele não tem qualquer relação com o setor regulado.
Apesar de a imagem do metanol ter sido afetada negativamente, ele segue como um dos pilares da indústria química moderna. Entender sua função e suas potencialidades é também parte da transição energética. O desafio agora é garantir a segurança do consumo, estimular a produção com menos emissões e consolidar o Brasil como um player relevante também nesse mercado para que a evolução energética do país tenha mais um aspecto de exemplo e vanguarda para o mundo.